quinta-feira, 19 de março de 2009

Memórias entaipadas


Existem lugares, que por uma razão ou outra, aprendemos a gostar e a senti-los como especiais, únicos.A construção deste edifício aniquilou o muro dos reformados, e cegou os olhos dos habitantes que estavam familiarizados a uma visão de lembranças.

O declínio em anfiteatro que se esbatia na Fonte Velha. Tropeçando na ribeira outrora imponente, abundante de água e de vida, a vida das lavadeiras, das rãs, dos miúdos a trepar o valado, para apanhar as uvas das parreiras, do Joaquim Ferradeira.Hoje, a ribeira recusa-se a desempenhar a sua função. A Fonte Nova, as dores nos braços de tirar água com um balde de alumínio.O lavadouro, (onde aos dez anos tirei o meu curso intensivo de lavar roupa), lugar de culto, num turbilhão de memórias límpidas. O Poço da Amendoeira, burros meticulosamente apetrechados com albardas, cangalhas e cântaros, esperando pacientemente pela sua vez. O balde, com o toque mágico na corda para vira-lo e enchê-lo. Hoje, o poço está tapado. Mas a nossa memória, não.

Até a Procissão parava, voltava os andores para o poço, com todos os Santinhos perfilados, a rogar ao Poder Divino; fertilidade nos campos e água em abundância.Este quadro, ontem de cores vivas hoje de um cinzento tristonho, é o local mais abençoado de Pechão.Verdade que com o passar do tempo vamos sentindo aquela nostalgia própria da idade.São também esses olhares que nos fazem sentir vivas.A relação física e espiritual com esta visão é baseada, na vivência e nos olhares que repetíamos quase diariamente, maquinalmente, ao passar naquela rua, como um destino, por gosto ou simplesmente curiosidade, felizes ou não. E tudo isto é história e estórias da nossa gente. Aromas com passado, que não se largam tão depressa, neste amável limbo do tempo.Este lugar está no altar dos sítios por quem os naturais de Pechão têm uma devoção mais profunda.

Por mim a Procissão podia voltar a parar no mesmo lugar, e evocar as preces aos novos moradores, para que sejam muito felizes, nas suas novas casas.A eles, basta abrir a janela das traseiras e olhar. Porém com uma certeza, não vêem o mesmo que nós.

4 comentários:

  1. Carmo Dias disse...
    Li para a minha avó e ela lembra-se de tudo. tb falou das mulheres que tinham que ir cedo para o ribeiro para apanhar os melhores lugares. Achou muito bonito.
    10 DE MAIO DE 2007 18:30

    pechanense disse...
    Olá Arlapa!
    Muitos parabéns pelo blog.
    Certamente que serei um leitor assíduo!
    Um abraço
    11 DE MAIO DE 2007 10:32

    Empreiteiro disse...
    Você é uma lírica os tempos são outros, a construção dá dinheiro e dá casas pró povo
    15 DE MAIO DE 2007 17:42

    Anónimo disse...
    Não vêem o mesmo que nós, isso não. Os olhos com que a memória vê são bem diferentes de qualquer vista actualizada.
    1 DE JUNHO DE 2007 22:31

    Anónimo disse...
    É o progresso da nossa Aldeia, ou será que também há quem esteja contra o evoluir da mesma?
    São mais famílias a viver em Pechão, mais dinheiro para a Junta de Freguesia, que bem precisa para poder executar mais obras.
    Nem que seja para comprar porta-lixo para colocar na Rua 25 de Abril, onde existem para aí meia dúzia, colocados á vinte anos.
    É obra...
    11 DE JUNHO DE 2007 20:27

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  2. Oh querida Arlapa... bem me parecia que já tinha lido isto noutras escrituras.... Realmente a velhice é muito contrária à criação... e repetir-se taambem é sinónimo de velhice.... por favor, Arlapa, sê velha, mesmo que nâo cries muito ao menos não te repitas muito... pelo menos para não dar nas vistas... especialmente de alguns "Lobos-maus" que andam por aí...

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  3. Caro amigo

    Não está fácil a vida da velhota, já fui criticada por ter apagado o blog, e consequentemente alguns textos que até eu acho que não estavam assim tão maus. Agora sou criticada por repor alguns textos mais antigos. Mas num ponto tem toda a razão: a criatividade não abunda e a Alzheimer já vai dando sinais bem visíveis. Assim vou entremeando alguns (muitos) posts antigos, e esperando que nalgum momento de lucidez me ocorra algo de novo.
    Não seja tão exigente com os velhos, estão em fim de vida, devemos ser mais tolerantes e compreensivos.
    Volte sempre.

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  4. Na verdade é muita obra feita em Pechão, ou o betão não haveria de cá chegar, se ele abunda por todo o lado. Repare uma coisa meu amigo,e tome nota para não esquecer no futuro, muitos dos novos residentes, só vêm dormir a Pechão, ainda não tiveram tempo dispunivel em horário nobre da Junta, para efectuarem a actualização do seu receseamento, daí encontrarem-se aqui a residir,mas continuarem a contribuir para a Freguesia onde antes residiam.Isto é o mal das Aldeias dormitorios, não é só em Pechão.PASSAR BEM

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